sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Samba Esporte Fino (ou Carolina) - Seu Jorge


Continuando a 'saga', como disse o colaborador eventual e crítico do nosso blog - o amigo imaginário Baiano, vamos a um caso de especial sucesso, o ex-integrante (e talvez futuro, porque sempre pode haver um retorno) da quase desconhecida banda Farofa Carioca (que, claro, merece um post aqui pelo seu excelente primeiro disco; é único?).
É um bom disco, excelente pra ouvir no domingo no churrasco, inclui bons e criativos sambas, nas suas muitas vertentes (nisso o samba lembra o metal com muitas subdivisões): samba funk, samba de raiz, samba soul, pagode etc etc etc.
Lançado também no exterior, onde teve o nome de 'Carolina', inciou uma trajetória de sucesso do Seu Jorge, incluindo participações em filmes de Hollywood com direito à trilha sonora e tudo. Mas mesmo na parte musical, Seu Jorge é um dos maiores sucessos brasileiros no exterior hoje em dia.
O cara já foi morador de rua, tendo saído dela através do parceiro no Farofa Carioca, o Gabriel Moura.
O nome do cd é sensacional, mesmo os que não gostam do cara ou do disco têm que admitir.
A produção é do boa praça mezzo brasileiro mezzo americano que produziu muita gente: Mario Caldato Jr. juntamente com Seu Jorge e uma faixa (Em Nagoya eu vi Eriko') produzida pelo DJ Zé Gonzales e Daniel Ganja Man (ô nomezinho pala...).

Então, vamos às músicas... Seu Jorge, que de bobo não tem nada, começa pela jóia 'Carolina', samba suingadíssimo, começando tranquilinha só com violão, depois com os metais pegando fogo, num fraseado cheio de síncopa. Além da letra safadinha, cuíca aparecendo aqui e ali, cordas ali e aqui, refrão levanta plateia, um detalhe é que os arranjos e frases instrumentais dos versos vão mudando durante toda a música, assegurando que não se caia na mesmice: muito bom gosto e malandragem, no melhor sentido.

'Chega no suíngue' já se posiciona mais pro samba funk, difícil resistir ao balanço. Ainda tem uns barulinhos de sintetizadores vintage, um toquezinho de modernidade, afinal Mr Caldato tá na área. Os coros femininos mais uma vez levantam o astral.

'Mangueira' é um daqueles típicos samba de exaltação a escolas de samba e/ou comunidades, ou ambos como no caso aqui, que começa até citando 'Alvorada' do Cartola. Mais uma vez guitarras de fundo e voz em vocoder são o toque muderno da faixa. Samba funk maneiro e o duplo sentido 'melhor parada da cidade'...

Chega a vez do partido alto 'Pequinês e pitbull', com citações e semelhanças com o Zeca Pagodinho, sacadas engraçadas e a voz da Velha Guarda da Mangueira.

'Te queria' chega pegando fogo, mais acelerada, com metais mais uma vez travessos e um baixo muito legal, samba funk balançante, com mudanças espertas no andamento.

'O samba taí' é um daqueles sambas que tentam explicar de onde veio o samba ou, como aqui no caso, ra onde ele foi, ou melhor ainda, onde ele está: 'tá no sangue daquele que sabe sambar'. Clássico e tradicional, com direito a uma cuíca malandra e aquele coro das pastoras.

Aqui vem o destoante reggae 'Hagua' (sic), sobre a crescente escassez da água, aquela aboragem apocalíptica que só deve aumentar até o fim do ano de 2012 ou, se as profecias estiverem certas, até o fim do mundo...

'Samba que nem a Rita a Dora', nome infame...começa com uma citação de 'A Rita' e continua desenvolvendo a historinha por aí, citando mesmo o Chico, sambinha gostoso e redondinho. Estranho é um 'sem mais e sem menos' que ele solta lá no meio...

Uma lentinha pra variar, 'Madá' é bonita, com um baixo fretless e um trompete intercalando frases com a voz. Classuda.

'Funk baby' é bem discoteca, com vozes de fundo bem sensuais, meio estranha no disco.

Mais um reggae, 'Em Nagoya eu vi Eriko' é legalzinha. E só.

E para terminar, Seu Jorge traz Carlos Dafé, lenda soul, em 'De alegria raiou o dia', cheia de charme.

(Dão)

sábado, 6 de outubro de 2012

Cidade de Deus - Antonio Pinto & Ed Cortes



Nem precisa falar do filme, um dos melhores da história, e isso em listas estrangeiras, como a do jornal inglês The Guardian. Mesmo a ótima trilha sonora foi por demais comentada, principalmente pela popularização da antes renegada fase racional de Tim Maia, a ponto da revista Rolling Stone brasileira considerar aquela boa cópia de bandas americanas um dos dez melhores discos brasileiros da história. O disco é bom, claro, mas fala sério. É muita falta de conhecimento da história. Ou muita vontade de embarcar num hype. Ou os dois, não importa, revista de rock pode até criar um hype, mas embarcar em um é que nem chegar atrasado e ainda pegar o bonde errado. É indesculpável. Bem, nunca mais perdi meu tempo com ela.
Mas voltando, o que foi pouco comentado foi a parte instrumental da trilha sonora, composta por Antonio Pinto (já comentado aqui no disco Pequeno Cidadão) e Ed Cortes. Verdadeiro tratado e síntese do funk brasileiro. Mas não o carioca, falo daquele criado por James Brown e que por aqui foi devidamente adaptado e misturado, gerando música de altíssima qualidade, inclusive pelo já citado Tim, que é influência, claro. Assim como a Black Rio. E Jorge, claro, num violãozinho ali no meio de Funk da Virada. Parece que quiseram homenagear seus heróis, mas de maneira sutil.
A trilha começa literalmente com porradas, socos na porta e o clássico diálogo pulpfictioniano: Quem é, quem é? (...) Quem falou que a boca é sua, rapá?  (...) Colé Dadinho? Dadinho é o caralho, meu nome agora é Zé Pequeno, porra! E atacam os metais.
Não vou descrever as músicas, não, essa é mais a onda de Dão, mas a sequência instrumental começa com as três primeiras (Meu nome é Zé Pequeno, Vida de otário e Funk da virada), perfeitamente mixadas, prontas pra botar numa festa. São curtinhas, dá 5m30 no total.
A quarta música, Estória da Boca, é mais lenta, cuiquinha pontuando, clima de samba, combina com a sexta, A Transa, mais lenta ainda, que o nome já diz, é cheia de suingue e bem sensual.
Daí, pule pra 13a e 14a, Morte de Zé Pequeno (sacanagem, já conta o final o filme) e Batucada Remix, uma versão eletrônica de todas elas juntas, mixadas pelos DJs Camilo Rocha e Yah.
Nunca ouvi ninguém falar, mas dá pra perceber influências em muita coisa que foi feita dali em diante, o Drum‘n’Bass brasileiro sendo um. Certamente influenciou também o Bixiga 70, que terá seu disco de 2011 comentado aqui, e que desde já recomendo fortemente. Mais recentemente, Antonio Pinto participou, tocando baixo, compondo e arranjando, do Almaz, banda com Lucio Maia na guitarra, Pupilo na batera e Seu Jorge nos vocais, que atualizou a bossa-nova, incorporando psicodelia, peso e guitarras, e que também vai aparecer por aqui.
O clima geral é retrô, mas Pinto e Cortes foram muito além. Atualizaram os anos 70, juntaram um monte de groove e timbre antigo com umas batidas mais novas e mostraram que a caravana passa. E passa bem.

[LM]